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A tarde em que a gentileza quase nos mata | Fabrício Cardoso

Nunca imaginei que gentileza pudesse ser um problema. Mas dessa vez foi.

Quando o Uber nos deixou na porta do Oba, o aconchegante estádio do Vila Nova encravado no bairro que empresta nome ao clube, estávamos na penúltima das 14.952 horas de uma fome.

Estou longe de Pelotas há mais de duas décadas e jamais havia passado 623 dias sem ver o Brasil jogar do jeito que essa paixão exige: na arquibancada, com a respiração entrecortada cada vez que nos atacam, com alívio e esperança quando recuperamos a bola e um orgulho desmedido quando alguém, com nosso distintivo ao peito, vai para uma dividida como se estivesse salvando um filho.

Não é portanto uma tarefa emocional para se cumprir naquele silêncio polido que os cafonas pretensiosos acham elegante. O Xavante em campo diante dos olhos provoca uma agitação interna tão intensa que, sem uma despressurização pelas cordas vocais, corre-se risco de um colapso.

Foi por saber dessa condição fisiológica que praguejei contra o sorriso aberto da direção do Vila Nova ao nos receber na porta do estádio.

– Que alegria tê-los aqui!

Numa cordialidade excessiva até para goianos, essa gente comoventemente gentil, fomos levados à tribuna, honraria prontamente aceita porque o sol do Cerrado começava a arder com a violência costumeira. Uma sombra cairia bem.

Além da cadeira mais confortável do estádio, puseram uma caixa térmica com água e gelo ao alcance da nossa mão. Dali, dava para ouvir as rádios locais já em transmissão. Num dado momento, o narrador disse que o Vila ia pegar “o fraquíssimo Brasil de Pelotas”, ou seja, duas ofensas na mesma expressão. Os conselheiros deles pouco faltaram nos pedir desculpas, constrangidos.

Definitivamente, não havia como seguir a liturgia xavante de arquibancada sem parecer grosseiro com o anfitrião. Sinto que passei uma tarde comportado como desejou meu pai, numa tarde em que quase fui linchado pelos gremistas por excesso de exaltação no falecido Olímpico, lá pelos anos 90. Ou pela minha mina, cujos olhos se cobriram de terror ao me ver escalar o alambrado da Baixada transtornado depois de um gol nosso num amistoso contra o Fluminense. Pô, mas era o Fluminense…

Bem, sobre o zero a zero, sofri com o Pierini improvisado e senti uma certa vibe de Diego Ivo no Arthur, esse guri de Minas que estreou na nossa zaga. Se mantiver essa solidez na defesa, talvez dê para imaginar sorte melhor.

Esse negócio de torcer para o Xavante é um desassossego permanente. Faz a mente oscilar entre os papéis que nos impõe. Em alguns momentos, considero um atrevimento tremendo ver nossos meninos fardados em canchas de Copa do Mundo, fazendo 39 vezes por temporada o trajeto até o aeroporto de Porto Alegre e isso tudo basta a mim, que vi jogo em Camaquã e Rio Pardo.

Mas também penso se essa minha resignação não é uma visão limitante das nossas possibilidades, porque, a despeito das dificuldades impostas a um povo mestiço num Rio Grande orgulhoso de purezas imaginárias, somos capazes de grandes coisas em Pelotas. Se na arte e na ciência conseguimos romper as barreiras da pobreza com talento, talvez no futebol, com lampejos de sorte e coragem, dê para ir além. Talvez.

No meio dessas dúvidas todas, me veio uma certeza. Só pude ver o jogo no estádio e interromper o jejum desse sentimento que me nutre a existência graças ao convite da direção do Brasil, a quem sirvo com textos esparsos, para necessidades específicas do clube. É algo que sempre fiz com sentimento de dever, porque o Brasil a gente não ajuda. Cuidamos porque é nossa obrigação.

Uns 30 minutos depois de deixar o Oba, quando já estava com meu filho Inácio entupindo as artérias num podrão das adjacências da Vila Nova, recebo uma mensagem de Whatsapp.

– Boa noite, Fabrício, muito obrigado pela companhia.

Era do presidente Nilton Pinheiro, leitor de Hermann Hesse, que dedicou a vida profissional a levar luz para os gaúchos e portanto não se mixa para qualquer escuridão.

O Brasil é assim. Até em anos mais angustiantes, sempre dá muito mais do que entregamos.

Três razões para reafirmar a fé depois da jornada em Goiás | Fabrício Cardoso

Dois meses depois de meter as tralhas num caminhão de mudança rumo a Goiânia, o Xavante tratou de recompensar o destemor por me enfiar nestas lonjuras com a Nêga Veia e os mandinhos. Seguramos aquele zero a zero no Castelão, subimos de divisão e a capital de Goiás seria a segunda cidade a receber mais jogos do clube em 2016. Se quisesse mais conforto, só alugando uma meia-água nos arredores da Baixada. Foram tantos anos deixando o asfalto sumir no retrovisor em perseguição ao Brasil, que chegara a hora de o Brasil vir atrás de mim.

Depois do revés com o tecnicamente hediondo Vila Nova, fiz um inventário matemático desta temporada e creio ter sido penalizado por me comportar como um torcedor preguiçoso, de sofá, desses dignos de figurar em propaganda de Pay Per View. Dos nove pontos disputados sobre gramas judiadas pelo sol de Goiás, somamos apenas um, lá em Itumbiara, contra o Goiás. Maledicentes já andam pedindo para eu mergulhar o pé no uísque que vão beber.

Porém, matemática é ciência exata, alicerçada na razão. Qualquer um que tenha fé, como temos todos nós, xavantes, não deve se ocupar dela com muito rigor. Tenho em mim que o sobrenatural escolhe os jogos do Brasil para se manifestar, o que denota extremo bom gosto dos mensageiros celestiais. Enquanto guiava o carro pelas ruas escuras do Setor Universitário, ruminando em silêncio aqueles 3 a 1 colhidos minutos antes na simpática cancha do Vila Nova, enumerei três sinais do além, para que não fraquejemos na fé.

xago1) Combinamos o esquenta num bolicho a 1,5 mil metros do estádio Onésio Brasileiro Alvarenga, o Oba. Chama-se Bar Tchê, mas nada ali remete à atmosfera pampeana. Paulistanos têm certa má vontade com quem se refere a cidade deles com o diminutivo Sampa. Quem fala Sampa, dizem, não é de São Paulo. Estou desenvolvendo idêntica reserva com esses bares-tchê espalhados pelo Brasil. Bueno, refestelados nas cadeiras de plástico do tal Tchê de Goiânia, emudecemos a garganta e nos atracamos nuns petiscos imersos em óleo de fritura. Ainda mastigava um naco de frango a Kiev quando chegou a PM de Goiás. A exemplo da semifinal da Série C do ano passado, contra o mesmo Vila Nova, seríamos escoltados até o estádio. Perfilamos os sete carros, com uma viatura à frente, abrindo espaços, e outra atrás, guarnecendo os flancos. Os PMs avançaram com giroflex ligado até o meio de uma avenida movimentada e interromperam o nervoso fluxo de fim de tarde para que nosso vagar não sofresse interrupções. Se eu não tivesse tido tantos professores maconheiros de história, que fizeram de mim um comunista empedernido, teria até tirado uma selfie com os soldados, como fazem nas passeatas com camisa da CBF. Já no OBA, o Pablo Lisboa, presidente e responsável pelas relações político-militares da Xagô, mostrou no celular o status no WhatsApp do tenente que consentira em nos proteger. Dizia: “Quem poupa os lobos, sacrifica as ovelhas”. Bali de gratidão. Bali em louvor à energia vinda do céu. O tenente não sabe, mas é xavante.

xago12) A cancha dos caras lembra vagamente o Estrela D’Alva, do Guarany de Bagé. Mal acomodamos as nádegas no pedaço de plástico generosamente chamado de cadeira, cujo aluguel por 180 minutos nos custou R$ 30, quando notamos umas meninas de meia três quartos e shorts sumários caminhando rente às placas de acrílico que, de uns tempos para cá, substituíram os alambrados na função de apartar dementes dos gramados. Traziam uma faixa: “Previna o câncer de próstata”. Foi ali, neste momento, que antevi em luzes faiscantes o golaço do Marlon, nosso único na noite escura do Cerrado. Aleluia!

3) A fé, dizem aqueles experimentados na devoção religiosa, é constantemente posta à prova. Não basta crer, é preciso reafirmar a crença a cada rasteira imposta pela vida. Pois a derrota de 3 a 1 para o Vila serviu para que eu confirmasse a crença numa divindade que, há dois anos, se agiganta em minh’alma. Falo do Ivan. Ivan é um menino do bairro paulistano do Campo Limpo. Foi colega de escola do meu filho Inácio, quando moramos em São Paulo. Tem 15 anos hoje, mas, bem antes, já demonstrava sensibilidade para entender quanto um campeonato citadino pode ser eterno. Passaram os dois, Ivan e Inácio, dezenas de recreios falando do Brasil de Pelotas.

Até que um dia, às vésperas da estreia na Série D, decidimos convidar o Ivan para ir a Itu. Naquele 20 de julho de 2014, primeiro domingo depois da final da Copa no Maracanã, foi deflagrada a mudança na existência de todos nós. O Ivan converteu-se um xavante desses que, ouvindo as rádios de Pelotas pelo celular, solta gritos solitários na Zona Sul de São Paulo a cada gol nosso. Quando lembrei dos 10 minutos em que estivemos na liderança da Série B, o Ivan rapidamente emendou:

– Foi lá em Belém, num gol contra depois do chute do Weldinho.

Sinto a pele se ouriçar enquanto escrevo esta lembrança. Porque me comovo quando alguém, pela nobre capacidade de se colocar no lugar do outro, passa a sentir o que sentimos.

xago2Além desta capacidade meio cristã, o Ivan demonstrou poderes. Subimos de divisão sempre que ele viu pelo menos um jogo do clube, com aqueles seus olhos esticados de filho de mãe japonesa. Foi assim na Série D, quando ele foi a Itu. Foi assim na Série C, quando nos abraçamos no Pacaembu, depois daquele pombo sem asa do Xaro contra a Portuguesa. Agora, quando estacionamos nos 45 pontos, o Marcelo Barboza, da Xasc, e o Fábio Dutra, da Xasampa, me rogaram, quase de joelhos:

– Fabrício, busca o Japa!

O Japa jogou-se num avião em Congonhas, às pressas, e nos ladeou nas arquibancadas de Goiânia. Deu no que deu, mas nada nos autoriza a questionar as bênçãos que ele é capaz de nos ofertar. O erro foi meu, crente indisciplinado, que deixei para recorrer ao Ivan tarde demais, faltando apenas quatro rodadas para o fim do campeonato. Toda contribuição sobrenatural tem limitações. Continuemos a crer, pois.

Apesar desta fé reafirmada neste longo testemunho, também sou um amante das certezas. Me é confortável saber que, ano que vem, estaremos todos juntos, renovando a esperança nesta obra tão bem conduzida pelo Rogério e seus (nossos) apóstolos. Não são tropeços em terras distantes que nos farão fraquejar. Até porque, em Pelotas, só nos jogamos em terras distantes.

Sonho apenas postergado

O Brasil viajou para Goiânia em busca de uma vitória para seguir brigando por uma chance de acesso à Série A do Campeonato Brasileiro, mas a noite na capital goiana não foi das melhores para o nosso Xavante. Depois de um bom primeiro tempo, o Brasil não repetiu a boa atuação no segundo tempo e o Vila Nova venceu a partida por 3 a 1 e postergou o nosso sonho de Série A para o ano que vem.

O Vila saiu na frente logo aos cinco minutos em cobrança de falta de Fabinho. O atacante goiano bateu com categoria, sem chances de defesa para Eduardo Martini. Logo em seguida o Brasil teve grande chance com Jonatas Belusso mas o atacante rubronegro chutou em cima do goleiro. O gol de empate saiu após cobrança de escanteio onde Belusso cruzou da esquerda e Marlon, que havia batido escanteio na direita, bateu cruzado, em curva e marcou um belo gol. Foi o primeiro gol de Marlon em 27 jogos com a camisa do Brasil.

Na segunda etapa o Brasil parece ter cansado e o time da casa tomou conta do jogo. Moisés e Frontini marcaram para o Vila e o Brasil pouco conseguiu reagir para buscar o empate. E assim terminou a partida, com vitória do Vila Nova por 3 a 1.

Com a derrota o Brasil ficou com 49 pontos e caiu para a 11ª posição na classificação da Série B e matematicamente sem chances de chegar à Série B. A próxima partida será contra o Oeste, no próximo sábado, no Bento Freitas.

A campanha do Brasil na Série B foi surpreendente. Entramos na competição pensando em não cair e estamos terminando com aquele gostinho que chegamos perto do acesso. O Brasil cravou os dois pés no G-4 durante várias rodadas e garantiu a permanência na Série B com várias rodadas de antecedência. Toda a nossa campanha será devidamente destrinchada aqui no blog, mas não agora. Agora vamos curtir esses três últimos jogos e agradecer à esses jogadores pelos grandes momentos que vivemos nesse segundo semestre.

Foto: Carlos Insaurriaga

ÁUDIOS

*capturados da Rádio Pelotense AM/h4>

VÍDEOS

Melhores momentos – Imagens Premiere FC

Ainda sonhando com o acesso, Brasil enfrenta o Vila Nova-GO

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Diogo Oliveira é esperança de gols em Goiânia. Foto: Jonathan Silva

O Brasil entra em campo na noite dessa terça-feira em busca de uma vitória contra o Vila Nova-GO, em Goiânia, para seguir sonhando com o acesso à Série A. O Xavante precisa vencer seus próximos quatro jogos para tentar o acesso, tarefa nada fácil. Com 49 pontos na classificação, uma vitória hoje a noite colocará o Brasil novamente na briga pois as duas próximas partidas serão no bento Freitas, contra Oeste e CRB.

Rogério Zimmermann não contará com Elias, que ficou em Pelotas tratando a contusão que sofreu na partida contra o Joinville. No mais, todo o elenco está à disposição do comandante rubro-negro. O provável Brasil para hoje é Eduardo Martini, Weldinho, Cirilo, Leandro Camilo e Marlon; Leandro Leite, Washington, Diogo Oliveira e Felipe Garcia; Jonatas Belusso e Ramon.

O Vila Nova tem 46 pontos e não busca mais nada na competição. O time goiano não contará com o zagueiro Guilherme Teixeira, expulso na última partida. O Vila dve começar a partida com Wagner Bueno, Maguinho, Reniê, Reginaldo e Marcelo Cordeiro; Caíque, Fagner, Victor Bolt e Wellington Simião; Fabinho e Moisés.

A partida começa às 20:30h, no estádio Onésio Brasileiro Alvarenga, em Goiânia com arbitragem de Grazianni Maciel Rocha (RJ), auxiliado por Eduardo de Souza Couto (RJ) e Diogo Carvalho Silva (RJ).

Brasil já viajou rumo à Goiânia

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Foto: AI/GEB

Depois da grande vitória sobre o Vasco da Gama no último sábado, a delegação Xavante nem teve tempo para comemorar. No domingo o time fez um treino leve no Bento Freitas e no final do dia já viajou para Porto Alegre. Na manhã dessa segunda-feira a delegação embarcou para Goiânia onde o Brasil enfrentará o Vila Nova-GO na terça-feira, às 20:30h.

O voo teve conexão agora pela manhã em São Paulo e devem chegar à Goiânia no início da tarde.

Com 49 pontos na classificação, o Xavante ainda sonha com uma briga pelo acesso à Série A. É difícil, mas com uma vitória amanhã em Goiânia e com dois jogos em casa na sequência, contra Oeste e CRB, o Xavante pode renascer na competição.