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Porta-malas da paz | Pedro H. Krüger

por Pedro Henrique Krüger

Há quase vinte anos, o sempre perseverante Xavante digladiava-se nos gramados deste país com a sua torcida ao lado. Aliás, é uma das marcas do Grêmio Esportivo Brasil o ato de não negar fogo diante da possibilidade de disputar campeonato nacional. Pois bem, em 1998 outra vez estavam lá os Negrinhos da Estação em mais um jogo decisivo de 180 minutos.

No caminho, havia o Avaí Futebol Clube, um dos grandes de Santa Catarina. Ambos buscavam uma vaga no quadrangular final da Série C, no qual classificaria os dois melhores à Série B de 99. A regra é clara: se há brasileirão, lá vai estar o Brasil; e se houver Brasil, pode escrever que torcida não vai faltar.

Dito e feito. Com a Baixada lotada, empate em 2 a 2. O gol dos catarinenses que igualou o placar saiu aos 47 minutos do segundo tempo. O resultado visivelmente foi melhor para os visitantes. Mesmo assim, como é de praxe, a torcida Xavante mobilizou-se para a volta. O rubro-negro Marco Maffei, de 43 anos, recorda-se bem. “Saímos por volta da meia-noite daqui de Pelotas. Estávamos em uns 15 ônibus”.

Durante o trajeto, a festa, o samba e o ritual alcoólico foram devidamente respeitados e executados pela massa. Depois de mais de 700 quilômetros de distância percorridos, a torcida do Brasil fez uma “vistoria” pela capital catarinense, especialmente na praia. Porém, foi no estádio Aderbal Ramos da Silva – a Ressacada – que a celebração ganhou novos tons.

 


Marco Maffei, à direita, ao lado do seu filho, Lucas.

Marco Maffei, à direita, ao lado do seu filho, Lucas.


Quando a romaria Xavante chegou ao seu destino, viu e ouviu a torcida do Avaí. Engana-se, porém, quem pensa que estavam lá com os dentes cerrados ou dedos em riste. Pelo contrário, os Leões da Ressacada entoavam a plenos pulmões “Brasil! Leão! Torcidas de irmão”, numa recepção amistosa preparada em resposta ao tratamento recebido por eles aqui em Pelotas, no jogo de ida.

Para a surpresa de Marco Maffei ainda havia mais. Como gesto de boa-fé, surgiu uma Volkswagen Santana cuja carregava no porta-malas uma grande quantidade de cerveja mergulhada em gelo na caixa de isopor. “Do que eu me lembro, o pai de um daqueles torcedores que vieram ao Bento Freitas ofereceu a cerveja para nós”, comentou.

A confraternização em torno do líquido moralizador perdurou até o início da partida. Do portão para dentro, porém, o cenário mudou. Afinal, todos ali tinham uma partida de vida ou morte pela frente. Na arquibancada, os Xavantes tomaram para si parte do estádio – com a presença da faixa “Paz Xavante”. Já a torcida do Avaí quebrou na época o próprio recorde de público com as 20 mil pessoas.

Com os dois times em campo, o empate em 2 a 2 se repetiu e a decisão foi para os pênaltis. Nas cobranças, os catarinenses levaram a melhor: 4 a 2. Posteriormente, o Avaí terminou a Série C como campeão e chegou à Série B junto com o forte São Caetano.

Apenas em 2000, pela Copa João Havelange, Brasil e Avaí voltariam a se enfrentar. A partida de amanhã, portanto, vai reunir as “torcidas de irmãos” 16 anos depois. Desta vez, dificilmente vai aparecer uma Santana transbordando cerveja, mas essa história incrível nos ensinou duas lições. A primeira foi a vivenciada por Marco Maffei e outros tantos rubro-negros, que foi a boa convivência entre duas torcidas que lutavam por um lugar ao sol. Nessa briga, o Avaí levou a melhor – e isso nos trouxe a segunda lição:

O Xavante nunca desistiu. Ano após ano, sempre que pôde, gastou o que tinha e o que não tinha para jogar e viajar pelo país. Fez jus ao próprio nome Brasil e buscou uma nova epopeia nacional. Ela chegou com o “Castelanaço” e ainda continua. Agora, na Série B, a cinco pontos do G4, vai receber o Avaí num Bento Freitas lotado e em reconstrução. Uma evolução e tanto.

O que não muda, ou melhor, o que não mudou foi a essência do clube da Baixada: se há brasileirão, lá vai estar o Brasil; e se houver Brasil, torcida não vai faltar. Dessa forma, o Xavante constrói memórias aqui, ali e em todo lugar, dignas de um clube que tem o nome gravado na história. E por isso merece uma Santana repleta de cerveja.

Mesmo quando termina, o futebol é vida | Pedro H. Krüger

É um esporte que transpira paixão, constrói memórias, capaz de entristecer e alegrar, mas sempre produz sentimentos e sensações ligados à existência. O futebol é vida.

Duas traves num gramado. Arquibancadas. Uma bola. Gente por todos os lados. Esperança. O ludopédio é a vida experimentada em bando.

Torcida. Charanga. Antigamente, a cerveja. Na Baixada, a coisa ia mais além: cachaça. Há o grito de gol. O sofrimento. Futebol é coração.

É o coração que bombeia o sangue para transportar oxigênio. É o que nos mantém. No Grêmio Esportivo Brasil, os batimentos cardíacos confundem-se com o som emitido pelos tambores treme terra, e os nossos gritos somam-se aos instrumentos de sopro. No Xavante, eternamente o clube dos Negrinhos da Estação, do Bento Freitas, do canal do Pepino, o coração tem um papel ainda mais forte.

É ele o responsável por manter em movimento o nosso sangue e a nossa raça. O nosso hino, aliás, não existe apenas por existir. É uma canção que representa toda uma gente que vibra e chora, no Bento Freitas ou fora dele, pois o Brasil não joga sozinho.

Não é à toa que o nosso hino menciona o sangue, a raça, o vermelho e o negro, e a torcida do nosso campeão. Afinal, repito, futebol é a vida experimentada em coletivo.

Futebol é vida, cuja ganha tons de paixão com a camisa rubro-negra.

Às vezes, a vida não define local e data para terminar. Ou melhor, não sabemos quando ela vai recomeçar em um novo lugar.

Na noite de domingo, logo após o Brasil reatar os laços com a vitória, a nossa gente viu um dos nossos cair ao chão. Muitos o socorreram, pois torcedor Xavante não torce sozinho. No dia seguinte, 24 horas após completar 25 anos de idade, outro Negrinho da Estação nos deixou.

Não desejo flertar com a morte, mas a existência não cessa aqui.

Antes, porém, um dos nossos deixou um legado, pois relembrou que o futebol não é apenas um jogo. É a vida compartilhada com os seus, retorno a escrever. Por isso, ele nos deixou a seguinte mensagem após a vitória: meu presente de aniversário. Valeu, Xavante!

Valeu, Mauricio Moraes Quevedo.

Valeu, Antônio Alberto Moscarelli.

Vocês são a razão da existência do Grêmio Esportivo Brasil. Vocês são o coração que bombeiam o sangue Xavante e esse retumbar apaixonado não termina nunca mais.

Meus sinceros sentimentos em nome do Blog Xavante às famílias de Mauricio e Antônio.

Brasil sanguíneo! | Pedro H. Krüger

A primeira vitória veio, finalmente, e da forma como gostaríamos que fosse. Como bem destacou o próprio BlogXavante.com, foi uma “vitória com a cara do Brasil”.

Não é de hoje. Apenas o anunciar de que centenas (e muitas vezes milhares) de camisas vermelhas vão atravessar a ponte já é suficiente para causar, digamos, calafrios! O histórico comprova. Em informação dada ao Esportchê, Rubens Silva apontou que o clássico de ontem à noite seria o de número 260. Já contando a nossa vitória por 2 a 1, o Brasil saltou para 118 triunfos. O São Paulo (com 67 vitórias) perde até para o empate (76).

Dentro do gramado, o Brasil mostrou-se superior do início ao fim. Eu esperava que o time da casa fosse para cima, aproveitando o fator local e a torcida rubro-verde que lotou o Aldo Dapuzzo. Não houve pressão nem agressão à nossa defesa. Pelo contrário, o nosso time controlava a posse e as ações do jogo. Nena, por exemplo, perdeu grande chance dentro d’área, fora a bola que o zagueiro tirou em cima da linha. O empate no intervalo já não fazia justiça. No segundo tempo, voltamos com a mesma pegada e o gol saiu após muita luta.

Luta, Xavantada, que nunca deixamos de presenciar neste grupo. Podemos questionar, como já disse em textos anteriores, a qualidade técnica de um ou outro jogador, ou ainda as escolhas feitas pelo treinador Rogério Zimmermann e sua comissão, mas jamais podemos afirmar que os jogadores não jogam com brio. É, além de canalhice, uma mentira!

Ontem, o time precisou cabecear uma vez e chutar outras três para a pelota finalmente ultrapassar a linha do gol. Felipe Garcia finalizou forte, rasteiro, sem chances para o bom arqueiro adversário. Todos nós chutamos aquela bola envenenada. Na comemoração, meio time do Brasil foi à torcida e vibrou como de praxe: sanguíneo!

O gol abalou os locais. A partida em si já demonstrava que o Brasil merecia estar na frente há mais tempo. Nada parecia mudar esse panorama. “Xi, este mar não tá para peixe hoje”, algum anônimo dizia por aí. Não muito tempo depois, Nena entrou livre, leve e solto na área e optou em chutar ao invés de passar a Ramon, que invadia pelo lado esquerdo. Seria o segundo gol.

Rogério Zimmermann promoveu as entradas do Brock e do Gustavo Papa no lugar do Xaro e do Nena, respectivamente. Não demorou muito para a bênção do gol da vitória sair. Ramonstro invadiu a área e driblou o defensor deixando-o sem pai nem mãe. Cruzou forte e rasteiro para Papa que, sem nenhuma misericórdia, terminasse com os nossos dias sem vitória.

O São Paulo, já nos minutos finais, conseguiu descontar. A partir daí a partida ficou marcada por confusões dentro e fora de campo. A rivalidade manifestou-se como de costume. Infelizmente, Gustavo Papa e Marcos Paraná, que recém havia entrado, foram expulsos – Paraná, aliás, apenas reagiu ao ataque sorrateiro que sofreu, mas vamos acreditar que o juiz não viu.

Após o fim do jogo, mais confusão. Também ouvi muito chororô. Meus caros, a rivalidade entre Brasil e São Paulo apenas reflete a rivalidade histórica entre as cidades. Já houve até confusão em campeonatos estudantis que contaram com a presença de escolas pelotenses e rio-grandinas. “Se sair jogo entre madres de Pelotas e de Rio Grande dá confusão também”, disse meu pai enquanto acompanhava as “cenas lamentáveis”.

Foi a primeira vitória no estadual. O campeonato começou. Como disseram muitos torcedores bem-humorados, “estamos há seis jogos sem perder”. Para Rogério Zimmermann, nas últimas 17 partidas perdemos apenas para o Grêmio.

Aos meus amigos rubro-verdes, deixo os meus parabéns pela campanha até aqui, mas com o Brasil a coisa é diferente. Afinal, quem nasceu para ser caça nunca será caçador!