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Três razões para reafirmar a fé depois da jornada em Goiás | Fabrício Cardoso

Dois meses depois de meter as tralhas num caminhão de mudança rumo a Goiânia, o Xavante tratou de recompensar o destemor por me enfiar nestas lonjuras com a Nêga Veia e os mandinhos. Seguramos aquele zero a zero no Castelão, subimos de divisão e a capital de Goiás seria a segunda cidade a receber mais jogos do clube em 2016. Se quisesse mais conforto, só alugando uma meia-água nos arredores da Baixada. Foram tantos anos deixando o asfalto sumir no retrovisor em perseguição ao Brasil, que chegara a hora de o Brasil vir atrás de mim.

Depois do revés com o tecnicamente hediondo Vila Nova, fiz um inventário matemático desta temporada e creio ter sido penalizado por me comportar como um torcedor preguiçoso, de sofá, desses dignos de figurar em propaganda de Pay Per View. Dos nove pontos disputados sobre gramas judiadas pelo sol de Goiás, somamos apenas um, lá em Itumbiara, contra o Goiás. Maledicentes já andam pedindo para eu mergulhar o pé no uísque que vão beber.

Porém, matemática é ciência exata, alicerçada na razão. Qualquer um que tenha fé, como temos todos nós, xavantes, não deve se ocupar dela com muito rigor. Tenho em mim que o sobrenatural escolhe os jogos do Brasil para se manifestar, o que denota extremo bom gosto dos mensageiros celestiais. Enquanto guiava o carro pelas ruas escuras do Setor Universitário, ruminando em silêncio aqueles 3 a 1 colhidos minutos antes na simpática cancha do Vila Nova, enumerei três sinais do além, para que não fraquejemos na fé.

xago1) Combinamos o esquenta num bolicho a 1,5 mil metros do estádio Onésio Brasileiro Alvarenga, o Oba. Chama-se Bar Tchê, mas nada ali remete à atmosfera pampeana. Paulistanos têm certa má vontade com quem se refere a cidade deles com o diminutivo Sampa. Quem fala Sampa, dizem, não é de São Paulo. Estou desenvolvendo idêntica reserva com esses bares-tchê espalhados pelo Brasil. Bueno, refestelados nas cadeiras de plástico do tal Tchê de Goiânia, emudecemos a garganta e nos atracamos nuns petiscos imersos em óleo de fritura. Ainda mastigava um naco de frango a Kiev quando chegou a PM de Goiás. A exemplo da semifinal da Série C do ano passado, contra o mesmo Vila Nova, seríamos escoltados até o estádio. Perfilamos os sete carros, com uma viatura à frente, abrindo espaços, e outra atrás, guarnecendo os flancos. Os PMs avançaram com giroflex ligado até o meio de uma avenida movimentada e interromperam o nervoso fluxo de fim de tarde para que nosso vagar não sofresse interrupções. Se eu não tivesse tido tantos professores maconheiros de história, que fizeram de mim um comunista empedernido, teria até tirado uma selfie com os soldados, como fazem nas passeatas com camisa da CBF. Já no OBA, o Pablo Lisboa, presidente e responsável pelas relações político-militares da Xagô, mostrou no celular o status no WhatsApp do tenente que consentira em nos proteger. Dizia: “Quem poupa os lobos, sacrifica as ovelhas”. Bali de gratidão. Bali em louvor à energia vinda do céu. O tenente não sabe, mas é xavante.

xago12) A cancha dos caras lembra vagamente o Estrela D’Alva, do Guarany de Bagé. Mal acomodamos as nádegas no pedaço de plástico generosamente chamado de cadeira, cujo aluguel por 180 minutos nos custou R$ 30, quando notamos umas meninas de meia três quartos e shorts sumários caminhando rente às placas de acrílico que, de uns tempos para cá, substituíram os alambrados na função de apartar dementes dos gramados. Traziam uma faixa: “Previna o câncer de próstata”. Foi ali, neste momento, que antevi em luzes faiscantes o golaço do Marlon, nosso único na noite escura do Cerrado. Aleluia!

3) A fé, dizem aqueles experimentados na devoção religiosa, é constantemente posta à prova. Não basta crer, é preciso reafirmar a crença a cada rasteira imposta pela vida. Pois a derrota de 3 a 1 para o Vila serviu para que eu confirmasse a crença numa divindade que, há dois anos, se agiganta em minh’alma. Falo do Ivan. Ivan é um menino do bairro paulistano do Campo Limpo. Foi colega de escola do meu filho Inácio, quando moramos em São Paulo. Tem 15 anos hoje, mas, bem antes, já demonstrava sensibilidade para entender quanto um campeonato citadino pode ser eterno. Passaram os dois, Ivan e Inácio, dezenas de recreios falando do Brasil de Pelotas.

Até que um dia, às vésperas da estreia na Série D, decidimos convidar o Ivan para ir a Itu. Naquele 20 de julho de 2014, primeiro domingo depois da final da Copa no Maracanã, foi deflagrada a mudança na existência de todos nós. O Ivan converteu-se um xavante desses que, ouvindo as rádios de Pelotas pelo celular, solta gritos solitários na Zona Sul de São Paulo a cada gol nosso. Quando lembrei dos 10 minutos em que estivemos na liderança da Série B, o Ivan rapidamente emendou:

– Foi lá em Belém, num gol contra depois do chute do Weldinho.

Sinto a pele se ouriçar enquanto escrevo esta lembrança. Porque me comovo quando alguém, pela nobre capacidade de se colocar no lugar do outro, passa a sentir o que sentimos.

xago2Além desta capacidade meio cristã, o Ivan demonstrou poderes. Subimos de divisão sempre que ele viu pelo menos um jogo do clube, com aqueles seus olhos esticados de filho de mãe japonesa. Foi assim na Série D, quando ele foi a Itu. Foi assim na Série C, quando nos abraçamos no Pacaembu, depois daquele pombo sem asa do Xaro contra a Portuguesa. Agora, quando estacionamos nos 45 pontos, o Marcelo Barboza, da Xasc, e o Fábio Dutra, da Xasampa, me rogaram, quase de joelhos:

– Fabrício, busca o Japa!

O Japa jogou-se num avião em Congonhas, às pressas, e nos ladeou nas arquibancadas de Goiânia. Deu no que deu, mas nada nos autoriza a questionar as bênçãos que ele é capaz de nos ofertar. O erro foi meu, crente indisciplinado, que deixei para recorrer ao Ivan tarde demais, faltando apenas quatro rodadas para o fim do campeonato. Toda contribuição sobrenatural tem limitações. Continuemos a crer, pois.

Apesar desta fé reafirmada neste longo testemunho, também sou um amante das certezas. Me é confortável saber que, ano que vem, estaremos todos juntos, renovando a esperança nesta obra tão bem conduzida pelo Rogério e seus (nossos) apóstolos. Não são tropeços em terras distantes que nos farão fraquejar. Até porque, em Pelotas, só nos jogamos em terras distantes.

Sonho apenas postergado

O Brasil viajou para Goiânia em busca de uma vitória para seguir brigando por uma chance de acesso à Série A do Campeonato Brasileiro, mas a noite na capital goiana não foi das melhores para o nosso Xavante. Depois de um bom primeiro tempo, o Brasil não repetiu a boa atuação no segundo tempo e o Vila Nova venceu a partida por 3 a 1 e postergou o nosso sonho de Série A para o ano que vem.

O Vila saiu na frente logo aos cinco minutos em cobrança de falta de Fabinho. O atacante goiano bateu com categoria, sem chances de defesa para Eduardo Martini. Logo em seguida o Brasil teve grande chance com Jonatas Belusso mas o atacante rubronegro chutou em cima do goleiro. O gol de empate saiu após cobrança de escanteio onde Belusso cruzou da esquerda e Marlon, que havia batido escanteio na direita, bateu cruzado, em curva e marcou um belo gol. Foi o primeiro gol de Marlon em 27 jogos com a camisa do Brasil.

Na segunda etapa o Brasil parece ter cansado e o time da casa tomou conta do jogo. Moisés e Frontini marcaram para o Vila e o Brasil pouco conseguiu reagir para buscar o empate. E assim terminou a partida, com vitória do Vila Nova por 3 a 1.

Com a derrota o Brasil ficou com 49 pontos e caiu para a 11ª posição na classificação da Série B e matematicamente sem chances de chegar à Série B. A próxima partida será contra o Oeste, no próximo sábado, no Bento Freitas.

A campanha do Brasil na Série B foi surpreendente. Entramos na competição pensando em não cair e estamos terminando com aquele gostinho que chegamos perto do acesso. O Brasil cravou os dois pés no G-4 durante várias rodadas e garantiu a permanência na Série B com várias rodadas de antecedência. Toda a nossa campanha será devidamente destrinchada aqui no blog, mas não agora. Agora vamos curtir esses três últimos jogos e agradecer à esses jogadores pelos grandes momentos que vivemos nesse segundo semestre.

Foto: Carlos Insaurriaga

ÁUDIOS

*capturados da Rádio Pelotense AM/h4>

VÍDEOS

Melhores momentos – Imagens Premiere FC

Ainda sonhando com o acesso, Brasil enfrenta o Vila Nova-GO

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Diogo Oliveira é esperança de gols em Goiânia. Foto: Jonathan Silva

O Brasil entra em campo na noite dessa terça-feira em busca de uma vitória contra o Vila Nova-GO, em Goiânia, para seguir sonhando com o acesso à Série A. O Xavante precisa vencer seus próximos quatro jogos para tentar o acesso, tarefa nada fácil. Com 49 pontos na classificação, uma vitória hoje a noite colocará o Brasil novamente na briga pois as duas próximas partidas serão no bento Freitas, contra Oeste e CRB.

Rogério Zimmermann não contará com Elias, que ficou em Pelotas tratando a contusão que sofreu na partida contra o Joinville. No mais, todo o elenco está à disposição do comandante rubro-negro. O provável Brasil para hoje é Eduardo Martini, Weldinho, Cirilo, Leandro Camilo e Marlon; Leandro Leite, Washington, Diogo Oliveira e Felipe Garcia; Jonatas Belusso e Ramon.

O Vila Nova tem 46 pontos e não busca mais nada na competição. O time goiano não contará com o zagueiro Guilherme Teixeira, expulso na última partida. O Vila dve começar a partida com Wagner Bueno, Maguinho, Reniê, Reginaldo e Marcelo Cordeiro; Caíque, Fagner, Victor Bolt e Wellington Simião; Fabinho e Moisés.

A partida começa às 20:30h, no estádio Onésio Brasileiro Alvarenga, em Goiânia com arbitragem de Grazianni Maciel Rocha (RJ), auxiliado por Eduardo de Souza Couto (RJ) e Diogo Carvalho Silva (RJ).

Late mais alto que eu tô no G4

Mirando o G4 do Campeonato Brasileiro da Série B, o Brasil entrou em campo para enfrentar o Goiás que vinha com Walter no comando do ataque e fazendo a sua estreia no campeonato. Mas a força do Bento Freitas foi maior e o Brasil venceu a partida por 2 a 1 com gols de Felipe Garcia e Elias.

O JOGO

Uma marca registrada do Brasil jogando em casa nessa Série B é a pressão exercida pelo time nos primeiros minutos de jogo. A marcação é adiantada e no grito da torcida o time vai para cima. Foram poucos jogos em casa em que o Brasil não fez gol antes dos 20 primeiros minutos de jogo. E hoje não foi diferente. Em cobrança de escanteio pelo lado direito, Marlon levantou a bola na área e Felipe Garcia se adiantou ao goleiro Ivan e tocou meio que de ombro para o fundo das redes. Foi o décimo segundo gol de Garcia na Série B, deixando o camisa 7 isolado na artilharia da competição. Após os 20 minutos de jogo, o Goiás equilibrou a partida. Chegou com perigo em um lance de cabeça onde Eduardo Martini fez ótima defesa, no susto. E o equilíbrio foi confirmado com o gol do time goiano. Em cobrança de falta pelo lado direito, Ednei cruzou na área e Leandro Leite, tentando fazer o corte, raspou de leve na bola e ela entrou no canto direito de Eduardo Martini.

E foi no lance do gol do Goiás que uma cena curiosa aconteceu. Enquanto a bola voava em direção à área, um cachorro invadiu o gramado do Bento Freitas e entrou correndo área a dentro. Se ele tivesse feito isso uns 5 segundos antes, talvez não tivéssemos levado o gol. Na tentativa de retirar o cusco do campo, o lateral Juninho do Goiás tomou um baile do bichano que correu atrás dele até ser capturado pelos gandulas do clube.

Na segunda etapa o jogo seguiu equilibrado, com chances para os dois lados. Aos 26 minutos aconteceu o lance que mudou o ritmo da partida. No meio do campo, Washington derrubou o atacante Rossi do Goiás e o juiz apitou a falta. Mas ele deu falta pro Brasil, alegando que Rossi tocou a bola com a mão. Leandro Leite bateu rapidamente passando para Elias. O camisa 9 carregou a bola em direção à área, gingou em frente o zagueiro, puxou para o pé direito e bateu em curva, na gaveta. Um golaço! Elias, que não vinha muito bem na partida, enfim fez o seu primeiro gol com a camisa rubro-negra.

Depois do gol sofrido, o Goiás se jogou pro ataque. Já com Marcão no ataque, ao lado de Walter, o time goiano pressionou o Brasil que escapava com perigo no contra ataque. E em um desses ataques, Ramon foi lançado e saiu cara a cara com Ivan. Na frente do goleiro, Ramon se enrolou com a bola e perdeu o gol. Na sequência da jogada, Ramon levou a bola para a linha de fundo e cruzou para a área onde entrava Elias, livre, leve e solto. Já sem goleiro, e há poucos palmos da linha do gol, Elias bateu embaixo da bola e chutou por cima. INCRÍVEL! Isso eram 38 minutos do segundo tempo. Era fazer o gol e comemorar a vitória. O Goiás ainda tentou o gol de empate até os 49 minutos de jogo na forma do abafa, mas a defesa Xavante seguiu firme até os últimos segundos e garantiu a vitória Xavante.

Com a vitória o Brasil chegou aos 39 pontos e assumiu a vice-liderança da competição. A rodada será finalizada somente no domingo. A próxima partida será contra o Paysandu, em Belém, na próxima sexta-feira, 09/09, às 21:30h.

ANÁLISE DA PARTIDA

O Brasil venceu um time repleto de bons jogadores. Talvez o time do Goiás ainda não tenha encaixado, mas possui ótimos jogadores. Walter já foi artilheiro no próprio Goiás, Daniel Carvalho já jogou na Seleção Brasileira, o volante Adriano, ex-Santos, e o rápido atacante Rossi. E eles incomodaram. Mas o Brasil foi muito competente defensivamente. A ausência de Teco, machucado, não foi tão sentida pois Cirilo fez uma boa partida, marcando Walter de perto. Leandro Camilo foi um monstro na defesa. Talvez o melhor em campo.

Do meio para a frente, Garcia foi muito voluntarioso como sempre. Marcando e puxando os ataques. Ramon não foi tão acionado na partida de hoje. Mas teve duas chances claras para marcar e acabou não fazendo. Na primeira, em rebote do goleiro Ivan, ele pegou muito embaixo da bola e bateu com força uma bola que era no jeito. E a segunda foi muito estranha. Lançado e saindo cara a cara com Ivan, o destro Ramon tentou puxar a bola para o pé esquerdo para finalizar. E foi aí que ele se enrolou e perdeu tempo. É curioso isso. Dos sete gols do Ramon na Série B, salvo engano, cinco foram de perna esquerda. E ele é destro. Mas e o gol que o Elias perdeu? Meu Deus! Ainda bem que não fez falta. Tudo bem que ele fez um golaço e jogou bem. Mas não pode perder um gol daqueles.

Entre gol perdido, cusco no gramado, golaço de Elias e mais um gol de Garcia, realizamos mais um ótimo jogo e contra um grande time. Estamos em uma fase maravilhosa. Fruto de muito trabalho e, principalmente, das convicções do treinador Rogério Zimmermann. Ele é ranzinza, mas conhece MUITO esse time. Consegue sugar coisas boas dos jogadores quando parece que nada mais sairá dali. É um baita treinador.

Seguimos firmes, fortes e na humildade. Avante, Brasil!

Foto: Jonathan Silva

FICHA TÉCNICA

G.E.Brasil: Eduardo Martini, Weldinho, Cirilo, Leandro Camilo, Marlon, Leandro Leite, Washington, Diogo Oliveira (Marcão), Felipe Garcia, Elias (Nathan) e Ramon (Gustavo Papa). Técnico: Rogério Zimmermann.
Goiás: Ivan, Ednei (Marcão), Wesley Matos, Alexandre Matos, Juninho, Adriano (William), Patrick, Leo Sena, Daniel Carvalho (Carlos Eduardo), Rossi e Walter. Técnico: Léo Condé.
Local: Estádio Bento Freitas, Pelotas-RS.
Horário: 19:15h.
Arbitragem: Luiz Flávio de Oliveira, auxiliado por Emerson Augusto de Carvalho e Miguel Cataneo Ribeiro da Costa.
Gols: Felipe Garcia aos 10′ do 1º tempo e Elias aos 22′ do 2º tempo (GEB); Ednei aos 18′ do 1º tempo (GOI).
Cartões Amarelos: Elias (GEB); Wesley Matos e Rossi (GOI).

ÁUDIOS

*capturados da Rádio Xavante e Rádio Pelotense

VÍDEOS

Compacto Blog Xavante

Melhores Momentos – Imagens PFC

Goiás viu nascer o budismo xavante | Fabrício Cardoso

Talvez como compensação pelas lonjuras do oceano, Goiás é um Estado cortado por rios largos e caudalosos. Quem já despertou numa manhã de geada para encarar uma aula de geografia ou história, por certo já ouviu falar no Tocantins ou no Araguaia. Itumbiara fica às margens do menos famoso deles, o Paranaíba. Mas não é por falta de formosura que a existência deste veio d’água é sonegada a nós, pelotenses. O leito cristalino, de tom algo azulado, corre calmo e exuberante, roçando também as areias das Minas Gerais, lá na outra margem. Foi com o olhar perdido no lento avanço do Paranaíba rumo a um mar distante que encontrei um ensinamento para sobreviver, com um mínimo de compostura mental, a este 2016 que o Xavante nos enfiou.

Quando pego a estrada atrás do G.E.Brasil, sinto-me a caminho de uma batalha letal. Como resposta a anos de campeonatos curtos e letais, meu corpo reage como se um predador estivesse à espreita. Sinto palpitações, suadouros, meu pensamento não consegue sair da órbita do jogo. Minha mina, a Mônica, áureo-cerúlea não praticante (com o perdão do pleonasmo), insiste em me acompanhar nestas andanças. Faz isto pelo amor que nos faz querer estar juntos, todo dia, há 16 anos. Mas, num dado momento da viagem, ela sempre adverte nossos meninos.

– Seu pai está aqui só de corpo presente. Não adianta falar com ele.

Na sexta-feira, quando o sol se punha em Itumbiara, de fato me perdi em pensamentos. Mas meu silêncio estava mais ligado a serenidades do que a nervosismos. Ao chutar a porta e se meter num campeonato com 38 jogos, de maio a novembro, nosso clube nos deu a chance de desacelerar o espírito. A fronteira entre a vida e a morte está larga como o Paranaíba, o Tocantins, o Araguaia, a Lagoa dos Patos. A derrota continuará a ser um tropeço, mas na calçada – não mais à beira de um precipício.

Cheguei assim, numa vibração de monge tibetano, ao Juscelino Kubitscheck, cancha que a prefeitura construiu para o clube local que, de tão abusado, pegou até o nome da cidade para ele. Não sei por que, talvez vocês possam me ajudar a explicar, não simpatizo com clubes que roubam o nome da cidade. Bem, lá, a Polícia Militar nos escoltou com tanto desvelo, os funcionários do estádio nos distribuíram ingressos de graça para as cadeiras, as pessoas estavam tão maravilhadas com a presença uma gauchada insana, que o clima ficou adocicado demais. Levei uns 15 minutos até soltar o primeiro palavrão.

Entre um impropério e outro nas cadeiras vermelhas do JK, saquei o quanto trabalhoso será meu ministério para acalmar uma alma xavante. A começar pelos amigos de infância do capitão Leandro Leite, que vieram de Piracanjuba, a uns 150 quilômetros de Itumbiara. Um deles gritou tanto no gol do Felipe Garcia que, no intervalo, andava pelas arquibancadas implorando por um dorflex, temendo que a cabeça explodisse.
– Calma, tchê! – lhe disse, enquanto alcançava o comprimido redentor.

Minutos antes, quando o Nena se foi roçando as coxas para cobrar o pênalti, recuando a bola para o Renan, nosso espaço no estádio se tornou, subitamente, nos metros quadrados com maior risco de eventos cardíacos em Goiás. Vendo aquele sofrimento coletivo que era possível tocar, resolvi berrar, mentindo a mim mesmo, o que, segundo Renato Russo, é a pior mentira.
– Não vai fazer falta! Não vai fazer falta!

A provação maior para a minha conversão ao budismo xavante, porém, mexeu com a minha paternidade. O Goiás empatou o jogo. Meu guri, o Inácio, me olhou nos olhos, implorando para que eu dissesse algo confortável. Só me ocorreu ser sincero:

– Porra, se perdermos, foi para o Goiás, cacete!

O moleque começou a gemer, depois a balir, depois a ganir, depois a uivar. Emitindo sons, conjugou todos os verbos que nos aproximam dos animais. Ao ouvir o silvo do apito do juiz, indicando o final da partida, me abraçou lívido. Pesava com uma folha de almaço, exaurido ao extremo. O guri vai aprender a sofrer menos. Temos 34 jogos pela frente.

Na manhã seguinte, mergulhei os pés nas águas do Paranaíba, em agradecimento pela lição aprendida. Mal entramos na BR-153 e minha mina colocou o pé no painel do carro, o que para mim consiste num das mais sublimes vistas do planeta. Serenei enquanto o asfalto sumia no retrovisor.

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Estou absolutamente convicto de que não ficarei catatônico até o jogo contra o… Paysandu.

> Link da comemoração do Inácio: http://www.youtube.com/watch?v=ovHI7Di2Ljg